segunda-feira, 31 de março de 2014

Precisa-se de jaulas



            Transpiro indignação desde a publicação da pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada- Ipea, que aponta a indigesta realidade onde 65% dos brasileiros acreditam que se as mulheres andássemos “mais vestidas” ou nos comportássemos “melhor” as estatísticas de estupro seriam menores. Ah!Me poupe!

A culpa não é nossa!A doença não está em nossas cabeças. Nem a maldade, nem muito menos a selvageria monstruosa. Continuarei sendo mulher, vestindo o que me agrada, dançando como gosto, sorrindo com os olhos, alisando meu cabelo com a demência faceira de sempre. Não temos de pagar preço algum pelo fato de sermos mulheres.

É claro que a aberração está no achismo destes homens, mas principalmente no que abrange esta afirmação. Defendo desde sempre que uma coisa nunca é só uma coisa. Estes 65% são os mesmos covardes que espancam mulheres, abusam de crianças, queimam moradores de ruas, trucidam os homoafetivos e negros. Fico estarrecida por morar num lugar onde bem mais da metade dos homens questionados tenham esta opinião. É muito desvio de caráter para um país só. É muita decepção para seres tão doces...

A indignação é também não saber, claramente, quem faz parte destes números. É talvez conviver, cordialmente, com vermes desta estirpe sem sequer imaginar que um elogio pode esconder pensamentos e desejos tão imundos. Para estes doentes, tudo é um convite ao estupro. O pouco espaço no coletivo, a roupa usada em cidades de alta temperatura, o pegar um objeto caído no chão, o batom mais avermelhado. Repito que a doença não está em nós e que, portanto, a mulherada deve mesmo é soltar o verbo quando vítimas de assédio, abuso, estupro. Denunciar é a melhor forma de inibir ações futuras destes parasitas sociais.
Tenho a impressão de que no lugar onde há mais gente perigosa por metro quadrado é, exatamente, onde a justiça para este é caso é mais feita, mais levada a sério. Falo dos presídios, onde é sabido que estuprador paga com a mesma moeda pelo crime.  

Quando eu penso que a humanidade está dando um passo à frente, vejo que uma grande parcela ainda insiste em perpetuar paradigmas tão arcaicos, levianos, desumanos, condutas descabidas desde sempre. Para todos os 65%, uma jaula eletrificada! É o que merecem os animais irracionais que vêm as mulheres como pedaço de carne!Ridículos!Para estes brasileiros, o meu mais profundo  repúdio!

terça-feira, 18 de março de 2014

79 do barulho



P.S.: Minha mãe sempre disse pra não falarem coisas importantes comigo quando eu acabo de acordar. Nunca dá certo!rs

4 horas da manhã. Entre um ronco e outro, um axé ao longe. O toque do meu celular. O visor ainda turvo, mas deu pra ver que a chamada começava com 79. Aracaju. Em menos de um milésimo de segundo completo, um completo aperto no peito. Mainha! Abre parêntese. Mainha é minha sogra que mora em Aracaju, tem diabetes e ainda está na fase de adaptação alimentar. Doida por uma comida gorda. Passou Janeiro e Fevereiro em Teresina revendo os filhos Robinho e Iracema. Fecha parêntese.

Eu: Alô.
Do outro lado, palavras choradas:
_ Tô ligando pra dizer uma coisa ruim. Robinho tá bem? (pausa choramingada
). Diga a ele que liguei!
Eu: O que foi que aconteceu?Foi Mainha?
79: É. Você entendeu. Tu Tu Tu Tu Tu....

Eu não tinha como ligar de volta. No meu ouvido de quatro horas da manhã, Nininha (cunhada que mora em Aracaju) ligou chorando pra dizer com meias palavras que Mainha tinha morrido e ainda se preocupou se Robinho estava bem.
E agora?Como raios eu diria uma coisa dessa pra Robinho e Iracema? Antes de acordar Robinho, liguei pra Cema.

Iracema: Alô!O que foi?!
Eu:Cema.......(aquela pausa).Mainha......(a pausa e nada mais).
Iracema: Não, Larissa!Minha mãe não!Ô, meu Deus! Ela veio só me ver...

E haja grito de negação e haja choro e desespero muito. Quando Zequinha, marido de Iracema, pegou o telefone e perguntou como foi isso. Pediu o telefone de “Nininha” e ligou para saber detalhes. Eu disse a ele o que ouvi na ligação e fiquei aguardando informações mais precisas.
Foram cinco minutos eternos. O primeiro pensamento foi: Mainha não agüentou o regime, se passou pra uma mão de vaca e morreu. Depois pensei em como diria isso a Robinho? Liguei pra Zequinha e ele deu a melhor notícia:

_ Mainha está viva!Iracema tá falando com ela. Foi Mainha quem ligou pra você pra dizer que teve um sonho muito ruim com Robinho. Por isso perguntou se ele estava bem. E quando você perguntou se era Mainha, ela confirmou.

Iracema foi falar com sua mãe ainda chorando e desesperada, quando Mainha disse também em prantos:
-Não me esconda nada, minha filha!Aconteceu alguma coisa com Robinho, não foi?!Eu tive um sonho ruim!O que aconteceu com ele?Não me esconda nada!

Iracema tranqüilizou Mainha dizendo que Robinho estava ótimo dormindo em casa, enquanto metade do mundo caía por causa de um sonho e de uma ligação confusa às quatro da manhã.