sábado, 16 de julho de 2022

A INDIAZINHA DE MEIA











*Esta é a minha versão sobre o porquê de o povo piauiense ser o mais acolhedor e amigo! :)

Fazia uma noite tranquila quando ela viajou feito fluido sobre todos nós e desceu, juntamente com seu primeiro choro, naquela aldeia de cheiro alavandado onde exalava alegria em apenas tudo: cores, danças, rituais religiosos, contações de histórias, culinária. Logo nas suas horas iniciais, seus pés tão corados e franzinos foram vestidos com um par de meias amarelas, seguindo a tradição de seu povo, que acreditava ser a cor da fartura, da beleza e da prosperidade. Protegiam os pés, sabendo ser por onde passava um oceano de energia. Algo ainda perigoso para um ser tão indefeso.

Seu lugar no mundo, já sabia ela desde o seu nascimento, era aqui na Terra, mas também lá onde o brilho intenso e piscante aparecia todas as noites.  Bastava o sol se pôr para ela vidrar seus olhos no céu. Havia entre a indiazinha e as estrelas algo além da admiração. Era um bem-querer construído dia após dia, por anos. Arrisco dizer, algo a mais que meio amor. A menina também sentia-se, profundamente, acarinhada por suas amigas lá do alto.

Enquanto as outras crianças da aldeia corriam de pé no chão e soltavam gritos brincantes iluminados apenas pela luz da lua, ela andava por entre todos com a pressa de quem empurra a areia com as pontas dos pés e o queixo apontando pra cima, assim como seus olhos puxadinhos e brilhantes. Voltados para o chão, apenas seus pés e as inseparáveis meias amarelas, apesar de não ser mais um bebê.

Mas quem tá achando que a cunhatã não brincava? Quê? Se divertia horrores com as estrelas. Seu passatempo preferido era estender a mão para o alto e correr seus dedos de um lado para o outro formando caminhos estrelares, como os feitos na areia da praia. Por vezes, os astros se reuniam em balé apresentando para a pequena ondas de estrelas, corações que se transformavam em rosas, monumentos históricos até então desconhecidos por ela. Um espetáculo bem particular.

Certa noite, como de costume, dormiu conversando com as estrelas, perguntando para elas questões várias. Queria saber como era fora da aldeia e com quais perigos poderia se deparar, e ainda se conseguiria vencê-los.

Acontece que, naquela noite, ela viu em sonho, em uma das danças daquele luzeiro, a formação de um rosto curumim sorrindo.  Despertou atônita e ao abrir os olhos, para sua surpresa, o céu estava limpo como nunca visto antes. Criou-se nela um meio pânico. Ficou confusa. Achou que tinha perdido suas parceiras de toda uma vida. Para onde foram? O que havia de errado?

Saboreava a doçura de seus oito anos quando os mais velhos de seu clã perceberam na indiazinha o dom da caça. Era cautelosa e rápida. De andar leve em mata fechada. Tinha força para puxar a flecha e a paciência para aguardar o momento exato de abrir os dedos e deixar a lança seguir seu curso. Certeira. Cirúrgica como ninguém. Caçar era uma forma de ajudar sua tribo e de se preparar para enfrentar os obstáculos longe do seu lugarejo.

Após o sumiço das estrelas, antes mesmo de amanhecer, a indiazinha trocou a meia amarela pela vermelha. Para sua tribo, esta cor representava a Mãe Terra, maior divindade daquele povo. Símbolo da proteção maior! Pegou suas coisas e seguiu mata adentro em busca de respostas.

Andou por dias, semanas ladeando rios e sobrevivendo da caça e de frutas nativas. Não tinha descanso. À noite, seguia a direção riscada por estrelas cadentes no céu. No caminho, ia deixando flechas fincadas no chão, marcando o percurso que a levaria de volta à sua tribo. Passou um ano enfrentando onças, cobras, plantas venenosas, mosquitos, mas nada de respostas. Já com dez anos, desistiu de procurar por suas companheiras e também de saber de quem era aquele rosto mostrado em sonho. Optou por retornar para suas pessoas.

Dois passos depois de sua decisão, a menina foi se refrescar nas águas do rio. Ela não esperava que apesar de sua extensa andança por aquelas bandas ainda houvesse mistérios naquelas águas. E havia. A indiazinha foi sugada por um redemoinho. Rodopiava cada vez mais para dentro do rio ficando para fora da água apenas seus pés coloridos pelas meias vermelhas.

Abriu os olhos. Um clarão sem igual. Era tanta luz, mas tanta luz que ficou difícil identificar do que se tratava. O brilho foi, então, tomando a forma das estrelas. Estas a envolveram e abraçaram-na igualmente se faz quando com extrema saudade. A garota ficou muito feliz e também intrigada. Seria uma ilusão? Estaria ela voltando para seu outro lar, ao invés daquele para o qual tinha decidido retornar? Continuou girando.

Neste momento, lá de cima, todas as bilhões de estrelas reuniram-se, deram as mãos e, num ato sui generis, desceram à Terra para salvar a indiazinha. Ao tocarem o chão, os astros formaram o contorno de uma meia numa área de mais de 250 mil metros quadrados, tendo no centro o rio onde estava a pequena. O delineado possuía, com toda luz e intensidade, as cores mais bonitas que o universo possui. Tinha os tons da pedra opala, característica daquela região.

Enquanto o luzeiro resplandecia, uma puxada profunda de ar. A indiazinha havia sido resgatada por um garoto de sua mesma idade. Ele seguiu o clarão que vinha do rio e a encontrou. Ali estava o rosto apresentado a ela numa noite estrelada. A garota o reconheceu e o abraçou forte. Ele nada entendeu, mas também sentiu que dali nasceria uma grande amizade. E assim foi.

Ela voltou para sua tribo e contou o ocorrido. Disse que quando estava se afogando viu do alto estrelas que traçavam uma meia gigante e muito cheia de luz e que foi salva por um garoto que tinha visto no céu. Para seu grupo, parecia tudo muito estranho. Coisas de gente que ainda estava voltando a si, mas para ela fazia todo sentido.

A indiazinha e o garoto viraram os melhores amigos. Tão amigos quanto a indiazinha era das estrelas. E aquela região contornada pelos astros em formato de meia passou a ter o povo mais acolhedor, mais amigo e iluminado de todo o planeta. Mesmo muito idosa, a indiazinha conversava com as estrelas. Se manteve fazendo questionamentos vários; porém sempre acompanhada por seu amigo, que a salvou, e por seu par de meias amarelas.

 


 

segunda-feira, 7 de março de 2022

Sejamos fofas e fodas!


 Ganhei na loteria da vida por ter nascido mulher. Sério. Amo no grau máximo, por vezes, ter o olhar desmanchando de tão doce para coisas bobas, ensaiar caras e bocas na frente do espelho, fazer denguinho e também me ver impaciente, agitada, mais que o normal, uma vez por mês. Nem vou me alongar sobre maternidade. Sempre foi um sonho meu gerar uma vida. Já pensou se eu venho homem? Minha Nossa Senhora da Bicicletinha Sem Freio...Quero nem pensar (rsrs)!

Amo me pintar, me colorir, espalhar meu sorriso feminino por aí feito confete de carnaval! Adoro acarinhar do jeito só as mulheres sabemos. Sou muito estabanada. Me bato em tudo, dou topada no meio da rua ou no centro da festa. Nessas horas, o jeito é gargalhar de mim mesma com toda minha imensa timidez que só eu sei que tenho. Cantora de banheiro? Claro que temos (rs)!

Sobre as batalhas que enfrenta-se pelo simples fato de ser mulher, não arrego de nenhuma. Vou pra cima com leveza ou rugindo igual leoa faminta. Depende do naipe do conflito (rs)... 

E essa minha carinha meiga que esconde uma “Pereirão”? Troco lâmpada de casa, ajeito torneira quebrada, sei fazer extensão de tomada, parafuso e desparafuso armários. Não passo aperreio doméstico.

Apesar de tantos obstáculos da vida, ser mulher é, para mim, a melhor coisa do mundo! Respeito muito a minha verdade, o que meu coração diz...  Deus, o Senhor lacrou demais quando me fez assim! Juro de dedinho! Mulheres, sejamos fofas e fodas! Feliz Dia Internacional da Mulheeeeeerr!!!