A primeira vez que
entrei lá quem me recebeu de braços abertos foi um susto. Um imenso couro de
cobra esticado na porteira avisava alguma coisa. Engoli seco o medo antigo e me
permiti ver todas as nuances das folhagens, o cheiro de mato misturado com cocôs
de cavalo e vacas.
Com 15 anos a
gente pensa que sabe tudo mesmo sabendo que viu tão pouco. Uma conta que não
bate. Mas na Volta da Várzea eu queria mesmo era voltar à meninice. E voltava
sempre que adentrava aquela bendita porteira.
O primeiro convite
veio durante um intervalo da escola. Uma “recém-amiga” me perguntou se minha
deixaria eu viajar com ela para fazenda da sua família. Felizmente minha mãe já
permitia certas solturas.
Foi na Volta onde
aprendi a andar a cavalo, banhar de rio, correr grandes perigos. De manhã cedo
tomávamos café naquela típica mesa de interior: cuscuz, ovo, leite ainda
espumando, queijo artesanal, carne de sol. Um banquete. Depois de nos fartarmos
cada uma seguia para seu cavalo, já celado. Atravessávamos a BR e do outro
lado, um campo enorme de mato baixinho com trilhas e muito ao longe uma casa de
palha. O lugar perfeito para travar corridas entre nós. Éramos muito velozes.
Tudo resultado da inconsequência juvenil. Hoje, talvez umas galopadas bem
comedidas.
Pegando um dos
caminhos, o rio Jenipapo. Campo Maior tem sim seus encantos. Quantas vezes
fomos àquele lugar nos refrescar e molhar a cela dos cavalos, para ira do tio Mariano, pai de Marina. A gente nem se
importava (risos).
Um dia fizemos
diferente. Saímos depois do almoço e desta vez, éramos cinco amigas na fazenda
e ao invés de irmos a cavalo para o rio, fomos numa charrete puxada por um
jumento. Na ida, muita gasguitisse, riso. O jumento foi numa carreira só. Ô alegria
grande. Banhamos no Jenipapo até criar
rugas nas mãos. O sol foi caindo e na hora de voltar pra casa, cadê que o
jumento quis andar?! Quis não. Não tinha cipó, espora, chicote, nada que o fizesse
dar um passinho sequer. Bateu o desespero. Cinco adolescentes da cidade grande
distante da fazenda, no meio do mato e com um jumento pra fazer andar fosse
como fosse.
Olha que era reza,
era choro, era cobra verde passando por debaixo da gente. Era feito um
revezamento. Uma ia puxando o jumento e as outras em cima da charrete. A que
puxava sempre era que mais chorava. As que tavam em cima choravam pra dar o
apoio(risos).
Anoiteceu e a
gente lá com o medo aumentando igual juros de financeira. Nessa altura, tia
Andréa, mãe da Marina, já estava fazendo promessa pras filhas alheias e a dela
aperecerem. Tio Mariano já havia mandado os funcionários da fazenda atrás de
nós. Até que por volta das 8 da noite, chegamos na cerca de arame farpado em
frente à porteira da Volta. O belo do jumento ficou mesmo só amarrado na cerca.
No aperreio que estávamos não dava pra fazer o caminho completo. Passamos por
baixo do arame e depois pelo receptivo couro de cobra esticado.
Depois da bronca
que recebemos, um convite inesperado. Na casa faltou luz e o pai da minha amiga
chamou para conhecer a Bilheira, uma outra fazenda também da família. Esta com
mais de cem anos e muitas histórias de fantasmas. Fomos, mas aí é prosa pra
outra talagada de pinga.